03/04/21

Braço de ferro

Viva, costa.

Esta semana fizeste-me lembrar um sujeito que fez a recruta comigo. Não havia forma de fazer com que o rapaz alinhasse o passo com o resto do pelotão. Mais tarde, aquando do juramento de bandeira, enquanto assistia à cerimónia, a mãe dizia orgulhosa: “Daqueles todos, o único que leva o passo certo é o meu filho." Neste momento não sei se existe alguém que diga o mesmo de ti. Sabes, eu creio que é tempo a mais nesse galho do poleiro. E durante esse tempo, ao contrário da grande maioria dos portugueses, que mais não têm para esburgar dos ossos, vejo-te cada vez mais nédio e anafado. Eu já estou por tudo. Se em cima de uma crise pandémica tivermos que levar com uma crise política, pois que seja, desde que acabem de vez esses teus tiques intriguistas de chantagista corriqueiro.

Eu sei que a tua couraça política é dura de roer e que nesse xadrez és um mestre, tal como reconheço a tua proficiência na arte do calculismo, mas parece-me estares a esticar a corda a um ponto tal que o mais provável é que ela quebre a qualquer momento.

Perante uma tomada de posição de políticos calculistas como tu, eu costumo sempre interrogar-me do que poderá estar por trás. Onde é que tu quererás chegar com esta ideia de pedir ao Tribunal Constitucional que fiscalize as três leis (de apoio social) aprovadas pelo Parlamento e promulgadas pelo Presidente da República? Conhecemos a tua resposta e a dos da tua laia: “Está em causa a Constituição e o regular funcionamento das instituições democráticas, blá, blá, blá…” Tu até podes ter toda a razão do mundo, mas perde-la pela tua falta de assertividade. Então, o ano passado houve um caso semelhante por ocasião da aprovação de um orçamento suplementar e tu, nessa altura, lembras-te qual foi a tua tomada de posição? Não, não puseste em causa a Lei Fundamental do país, limitaste-te a dizer que não era o momento oportuno para gerar um conflito entre o Governo e a Assembleia da República. Foi aí que se abriu um precedente e não agora como queres fazer parecer. Portanto, quanto à questão da defesa da Constituição, estamos conversados, mais valia estares calado. Interessa perceber é o porquê do conflito com a Assembleia da República agora e não o ano passado. Ou será que tens na manga outro tipo de conflito? Tens, é claro!.. Todos lemos os 12 pontos apresentados pelo Presidente da República para explicar o porquê de ter promulgado as medidas contidas nos referidos diplomas e, confessa, não estavas nada à espera que uma pessoa a quem tens demonstrado uma lealdade figadal, por quem te empenhaste afincadamente para que fosse reeleito, viesse, ainda a reeleição cheirava a fresca, trair uma amizade que parecia tão promissora… Para ti foi uma espécie de murro no estômago e então há que fazer braço de ferro para ver quem leva a melhor. Aqueles que poderiam beneficiar desses apoios que se lixem com F. De uma forma geral, tens levado as tuas birrinhas a bom porto, mas creio que desta vez podes cair na armadilha por ti próprio montada e sair dela um pouco maltratado. Seria bom que não te enganasses nos cálculos. Sabemos que tu sabes que de rio a santos nada se espera, mas é importante que reflictas nos 50 e tal por cento das pessoas que não têm ido às urnas e na subida exponencial de partidos como o chega, o pan e o iniciativa liberal (já não falo no da gaga porque ela acabou por dar cabo dele). Para os teus cálculos, não sei quem será mais útil. Em breve as autárquicas dir-te-ão se este braço de ferro era ou não escusado.

Fiquemos à espreita.

09/10/20

Populismo

 

O populismo aumenta na proporção da descredibilização do sistema democrático e das suas instituições. Quem é que dá crédito a agentes políticos que em 46 anos nada fizeram para combater a praga que, não obstante o esforço afadigado de um povo, faz com que os pobres estejam cada vez mais pobres e os ricos cada vez mais ricos, sendo a fatia dos pobres incomparavelmente maior do que a dos ricos? Falamos, é claro, da corrupção. Os populistas chegam ao poder porque as pessoas (o cidadão comum, aquele para quem a política se resume a um exercício de governantes e governados, onde os primeiros deveriam zelar pelo bem-estar dos segundos) cansam-se e perdem a fé um dia acalentada na vã esperança de que, mais dia menos dia, a honestidade será o que mais caracterizará quem os governa. O populismo é filho desse cansaço.

Nem era preciso aparecer nenhum ventura para percebermos o cansaço e o descrédito de um povo. Basta pensarmos que desde a primeira vez em que participámos em eleições livres a esta data, o número de pessoas que se desinteressou pelo voto octuplicou, o que, traduzido por miúdos, significa que a mensagem que a grande maioria do povo português quer fazer chegar aos seus políticos é, em linguagem simples e direta, a seguinte: ide todos bardamerda amais as vossas políticas.

Um dia destes assistimos a mais um caso daqueles de entreter, daqueles em que os protagonistas acham que a maioria não entende. E se calhar têm razão. O nosso primeiro ministro achou por bem não propor a recondução do presidente do tribunal de contas para um novo mandato. Choveu um chorrilho de comentários dos vários quadrantes insinuando que a não recondução estava relacionada com críticas apontadas por esse senhor num relatório, pondo em causa a transparência da utilização dos dinheiros que vão chegar da união europeia com vista à retoma pós-pandemia.

Segundo esse relatório, a proposta de lei do governo que pretende agilizar a contratação pública poderá “contribuir para o crescimento de práticas ilícitas de conluio, cartelização e até mesmo de corrupção na contratação pública”. Segundo o primeiro-ministro, o critério de não renovação de mandato para cargos de natureza judiciária, foi fixado pelo governo com o acordo do presidente da república, aplicando-se tanto a este cargo como à procuradora-geral da república. Só falta ouvir o senhor presidente do tribunal de contas. Veremos se ele irá à assembleia da república dar alguma explicação. Para mim, e se calhar para muitos portugueses, deveríamos acreditar nos juízes (desembargadores, conselheiros, presidentes dos tribunais, etc.). Digo deveríamos. Mas como? Que dizer de rui rangel, e luis vaz das neves (e de outros que não chega ao nosso conhecimento)? Eu poderei questionar: Será que, sabendo que não ia ser reconduzido no cargo, o senhor juiz presidente do tribunal de contas quis dar um ar da sua graça e apontar o dedo a situações que não apontaria caso fosse reconduzido?

E que dizermos dos casos sócrates, salgado, bancos, etc., etc.? É um cansaço mortal. É lógico que as pessoas deixam de acreditar. Para os populistas não é preciso mais nada, basta-lhes uma gorda fatia de abstencionistas. Depois é só servirem uma dose de retórica demagoga enfeitada com uns pozinhos de umas balelas quaisquer a um povo cansado de receitas que só servem para o espremer até ao canganho.

Não, eles não chegam ao poder pela força, chegam através do voto. E tanto faz que a abstenção chegue aos cinquenta como ao noventa por cento porque a lei eleitoral é cega nesse capítulo. Pior, se setenta ou oitenta por cento das pessoas não votarem e se dos vinte ou trinta por cento que votarem, a maioria votar populismo, o populista votado tem a faca e o queijo não mão para poder alterar a constituição a seu bel-prazer, como aconteceu, por exemplo, há uns anos na hungria.

Se tivermos em conta que os populistas têm neste momento uma arma prodigiosa para chegar à grande faixa de pessoas cansadas e persuadíveis, (veja-se o caso das eleições de trump e bolsonaro) poderemos dizer, sem nos enganarmos, que estamos perante uma situação deveras perigosa e que dentro em breve o planeta não será mais do que uma bola de conflitos imprevisíveis.

João Amaral

07/10/20

Hipátia

Périplo pela bíblia, esse livro a que José Saramago, de forma muito modesta, se referiu como sendo um livro de brandos costumes; não ficaria mal substituir “brandos” por “maus”. Trata-se do livro mais vendido em todo o mundo, não obstante ser, talvez, o menos lido. Calcula-se que sejam vendidos, anualmente, cerca de 10 a 12 milhões de exemplares.


Há uns tempos assisti a um filme na televisão em que o espaço temporal era a queda do paganismo, religião mãe durante tantos séculos da civilização romana, e a ascensão do cristianismo. “Ágora” era o título do filme e tinha como personagem principal Hipátia, considerada a primeira mulher matemática de que se tem registo na história e que, como a certa altura é referido, foi condenada a uma morte horrenda por um grupo de cristãos fanáticos, acusada de heresia e bruxaria, simplesmente porque não quis limitar-se ao seu papel de mulher, conforme referido na carta de S. Paulo (apóstolo de Jesus Cristo) a Timóteo, pois que a sua única religião era a filosofia. Diz essa carta em 2 - 9 a 2 – 15:

“9 Do mesmo modo quero que as mulheres se apresentem em trajes honestos, decentes e modestos. Que os seus enfeites não consistam em tranças, em joias de ouro, nem em vestes luxuosas, 10 mas sim em boas obras, como convém a mulheres que professam a piedade.
11 Que a mulher ouça a instrução em silêncio e em espírito de submissão.
12 Não permito à mulher que ensine, nem que se arrogue autoridade sobre o homem; convém que permaneça em silêncio, 13 pois Adão foi formado primeiro e depois, Eva. 14 Não foi Adão que foi seduzido, mas a mulher é que, enganada, ocasionou a transgressão. 15 Contudo, salvar-se-á, tornando-se mãe, uma vez que permaneça em modéstia, na fé, na caridade e na santidade.”

Quando ouso falar sobre a bíblia, muita gente me diz que eu não devo interpretar à letra tudo o que lá está escrito, ora, alguém será capaz de me explicar o que é que S. Paulo quer dizer nesta carta a Timóteo, que não seja, diminuir, subalternizar, enfraquecer (para não dizer outra coisa) o papel da mulher na sociedade?
Na verdade, se prestarmos atenção a todo o novo testamento, chegaremos à conclusão de que existe uma preocupação constante, sabe-se lá de quem e com que propósito, em fundar uma agenda pró masculina e anti feminina .

Quanto mais me debruço sobre esse calhamaço, mais me convenço que ele está na base, tanto da escravatura da raça negra, como da subalternização do papel da mulher na sociedade. E isto devido à falta de Hipátias e à anuência da maioria dos homens.


Joel

14/09/20

Eu não sou um, sou dois.

Ah, o ventura já está com 10% de intenções de voto nas sondagens! É claro. E é claro que vai continuar a subir. Se não, qual a alternativa? Quarenta e seis anos depois continuamos com a mesma forma de fazer política. Eu muitas vezes pergunto-me: porque será que a nossa gente continua a votar em pessoas que ao longo do tempo a única coisa que fizeram foi roubar e mentir? E se não o fizeram descaradamente, aliaram-se ou apoiaram alguém que o fizesse. Batem no ceguinho com a mesma desfaçatez de há quarenta anos atrás e o cego vai-se pondo a jeito para levar sempre mais. Aconteça o que acontecer, façam eles o que fizerem, esbulhem-nos do que quiserem, a sensação que fica é que tudo é esquecível e perdoável, e, quando chega a altura de escolher quem nos represente, escolhemos, maioritariamente, nada mais nada menos do que os nossos carrascos. É obra. Esses, pelo menos, que se calassem em vez de criticarem os venturas. Com que legitimidade? Criticam uma nódoa e estão impregnados de esterco.

Para mim chega. Esta ligação do nosso primeiro-ministro à candidatura do vieira ultrapassa todos os limites. Não é só os do bom senso, é todos. Depois tem a cara de pau de utilizar o subterfúgio que só ainda não caiu de podre porque ele sabe o povo que tem: eu não sou um mas sim dois indivíduos, o primeiro-ministro e o cidadão antónio costa e como o cidadão é do benfica... Estes políticos da treta socorrem-se sempre dos mesmos estratagemas para legitimarem as suas posições mais estapafúrdias. Imaginemos um padre de uma determinada paróquia. Certa ocasião os paroquianos dirigem-se para a igreja para assistirem à esperada missa de domingo. Quando lá chegam encontram-no cravado em cima de uma paroquiana. Depois de ele acabar o serviço, levanta-se com toda a calma do mundo e explica-se: este que estivestes a observar não era o vosso padre era o cidadão X que, para além de ser padre, também tem necessidades sexuais. Só que neste caso, os paroquianos encarregavam-se de o pôr a andar, no caso do costa dão-lhe mais um voto de confiança.

Desculpa, costa, mas o argumento de que sempre foi assim não cola. Se sempre esteve mal, haja alguém que tenha a coragem de dizer basta. Só que são muitos os anos de vícios entranhados nessa maldita arte de fazer dos outros estúpidos. Sinceramente, se as duas únicas opções que eu tivesse fossem ou tu ou o ventura, confesso que iria ter muitas dificuldades na escolha.

23/06/20

Depressão

A morte de Pedro Lima tem-me feito reflectir. Há várias questões que vagueiam na minha cabeça e uma delas é a seguinte: O que leva um homem de 49 anos, aparentemente saudável, com uma esposa bonita e cinco filhos com idades entre os 4 e os 21 anos, a por termo à vida?
Pode haver muitas respostas, mas eu só vislumbro uma (compreendo e estou plenamente de acordo com aquela que foi a sua companheira durante vinte anos quando diz "O Pedro foi certamente surpreendido pela própria dor que, naquele momento, lhe terá sido insuportável", isto é, ao Pedro, a dor de viver tornou-se muito mais pungente do que qualquer outra dor.
Todos nós, de forma mais ou menos intensa, sofremos de alguma dor, mas quando se trata de uma dor para a qual a única resposta que encontramos é a morte, então, isso deveria fazer-nos refletir. É que são milhões os Pedros por este mundo fora, e a tendência é serem cada vez mais a cada dia que passa.
Não deveria a comunidade científica debruçar-se mais sobre estes assuntos do foro mental? Ou estará essa gente, em conluio com os poderes políticos, interessada no enfraquecimento da nossa mente para mais facilmente a poderem controlar? Fica a dúvida.
Acredito que a depressão esteja relacionada com questões genéticas, mas também tenho poucas dúvidas de que, inconscientemente, somos desviados da realidade das coisas, para realidades abstratas manipuláveis. Na linha da frente destes mecanismos estão, obviamente, a televisão e a Internet. Estas duas ferramentas estão aí para alterar radicalmente o comportamento do nosso processador a bel-prazer de alguns. O grosso de nós, à semelhança do que sempre aconteceu ao longo da História, tanto a nível político como religioso, seguirá em carreirinha indiana para onde nos ordenam. E nem precisam de algemas nem grilhetas.
Às paginas tantas, questionamos os comportamentos dos nossos semelhantes e até os nossos. Sentimo-nos estranhos porque nos foi cortado o cordão umbilical que nos ligava ao real. 
Se nada for feito relativamente ao controle das novas tecnologias, vaticino que daqui a poucas décadas, a maioria de nós, não seremos mais do que seres ignorantes deprimidos. 

10/12/19


“Uma imagem vale mais do que mil palavras.”



Ao proferir esta frase, há 2500 anos atrás, talvez nem o próprio Confúcio imaginasse que viria um tempo em que uma imagem valeria mais do que todas as palavras alguma vez ditas ou escritas.

Tempos houve em que a palavra tinha muito força. Veja-se os casos da religião e da política. Se no primeiro caso fez com que se invertesse completamente o rumo da humanidade, no segundo levou ao poder alguns dos seres mais abjetos da nossa história.

Desde os tempos mais remotos, quem sabe desde a hora em que foi inventada, temos assistido a um despudorado e desajustado uso da palavra.
Na verdade, uma palavra, não é mais do que um conjunto de letras com um determinado significado que, juntando-se a outras, pode adquirir outros significados.

As palavras, devem ser ordenadas de forma a que produzam sentido, sob pena de assumirem o aspeto de hieróglifos ininteligíveis, ou, pior do que isso, algo legível mas que ninguém entende.

O tempo é de retórica. Não de uma retórica qualquer, mas de uma retórica agilmente construída por quem sabe de antemão que o discurso é de sentido único, sem direito a contraditório. E depois, como a nossa relação com as palavras é cada vez mais frágil, acabamos por comer gato por lebre sem nunca nos fartarmos.

Em contrapeso, temos aí a imagem e o seu imponente poder: mil, milhões, quantos milhões de vezes superior a quantas palavras alguma vez foram inventadas, para as passar para um lugar deveras subalterno. E, com retórica ou sem retórica, nem precisa de vir acompanhada... E então, se a fabricarmos, como por magia, através de malabaristas efeitos de corte e costura, para a ajustarmos ao nosso objetivo, bingo, cereja no topo do bolo… e lebre, nem vê-la.

Confúcio lá saberia dos porquês da sua frase, mas creio nunca lhe ter passado pela cabeça que uma simples imagem fosse suficiente para desestabilizar uma ou várias nações, para desencadear uma guerra ou agitar quantas almas existem na terra, que teria muito mais força do que todos os debates realizados num Conselho Europeu, numa reunião dos denominados G7 ou num Senado Norte Americano.


Jota

23/11/18


De Borba a Vila Viçosa, de Vila Viçosa a Borba.


De repente tudo se sabe!...

Que os fossos das pedreiras distam 5 metros da estrada em vez dos 50 previstos na lei, 

que existe uma variante, com outras condições de segurança, com pouco mais de 1 Km de extensão do que a fatídica nacional 255, e que a maior parte das pessoas não utilizava,

que muitas instituições e particulares já há muito haviam alertado para a falta de segurança daquele troço,

que morreram naquele incidente 2 pessoas e que mais 3 estão desaparecidas (muito provavelmente por este motivo),

que, apesar de tudo, ainda temos que dar graças a deus porque nesta tragédia, em vez de 5, poderíamos estar a falar de dezenas ou centenas de pessoas,

que se as imagens que agora vemos na televisão sobre o local fossem divulgadas antes de tudo isto acontecer e com a mesma insistência, muita gente optaria pela dita variante,

que para sabermos (só um pouquinho) porque é que isto aconteceu, à falta de autoridades de segurança e judiciárias, precisamos de ter uma Sandra Felgueiras,

que, politicamente falando, os “lóbis” se encarregam de silenciar quem é honesto pondo a nu a podridão do nosso sistema político onde só os bufos e lambe-botas chegam ao topo dos cargos,

que, para mal dos nossos pecados, à semelhança dos fogos do ano passado e da queda da ponte de Entre-os-Rios, desta tragédia não haverá nenhum responsável.

Sabemos, enfim, que neste canto à beira-mar plantado existe um povo a quem cognominaram de pacífico e submisso, que de maneira nenhuma prescinde do seu estatuto.

João Amaral