13/08/15

Silêncio na casa de Deus II




Há uns tempos atrás, publiquei um documentário intitulado “Silêncio na casa de Deus”, em que a BBC denunciava a violação e tortura de milhares de crianças, (muitas delas surdas), com o conhecimento da camada mais alta da hierarquia da igreja (João Paulo II, Bento XVI etc.) que, em vez de denunciarem e excomungarem os agressores, não só não mexeram uma palha, (ou melhor, mexeram,  para colocarem os agressores  em  lugares de privilégio) como criaram um fundo de milhões de dólares, para silenciarem as vítimas dos casos conhecidos.


Na verdade, a igreja e, especialmente, os considerados de “Vossa Excelência Reverendíssima” para cima, são peritos nesta questão do silêncio. E porquê? Porque sabem que, como diz ditado, “Da discussão nasce a luz” e a luz é o que mais impressão pode fazer a quem vive, e quer que os outros vivam, mergulhados nas trevas.


Raros são os casos em que essas toupeiras surgem das entranhas da escuridão para dar palpites, e quando isso acontece, é porque sentiram um ténue fio de luz invadir-lhes as grossas e pesadas pálpebras, como foi no caso das obras de José Saramago “O Evangelho Segundo Jesus Cristo” e “Caim”.


Esta semana, todos nós assistimos ao caso do padre de Canelas nas notícias e ficou bem patente a perseguição cerrada que lhe está a ser feita pela cúpula da igreja católica. Ele não teve qualquer problema em vir a terreiro explicar o que está na base dessa perseguição, chamando mentiroso ao bispo do Porto por ter manipulado as informações por si enviadas numa carta e convidando-o a tornar público o conteúdo dessa carta em que, segundo diz, pedia explicações no caso de um padre acusado de abusos sexuais. Mais, denuncia a promiscuidade da cúria diocesana com o poder autárquico. E repare-se no paradoxo da questão, perante o pedido de explicação sobre estas acusações por parte da RTP, o que é que faz a diocese? Não faz nada. Silêncio. Um silêncio ensurdecedor. E para quê? Para que nos bastidores possa mexer os cordelinhos e fazer o mesmo de sempre: colocar os abusadores a salvo da opinião pública e, se possível, dar-lhes um papel de relevo, e silenciar, difamar e desacreditar os delatores. Senão veja-se o que está a acontecer, o padre de Canelas surge na opinião pública como se estivesse envolvido em casos de abuso sexual e o caso do padre de quem ele pediu explicações, entretanto, já foi arquivado. É sempre assim, a igreja em vez de denunciar e punir os vermes que a empestam, arranja todos os estratagemas para que não sejam julgados e persegue quem os denuncia.


Assim me vou afastando do que foi um dos pilares da minha educação, porque me dá vómitos pensar que, de cada vez que acendo uma vela na igreja estarei, com certeza, a alimentar toda esta podridão.


Felizmente, no seio de tanta escumalha, ainda se vão encontrando alguns, muito poucos, padres de Canelas. Para ele os meus parabéns pela coragem.