13/03/11

Um dia na escola

Flash 13
Este quilómetro de distância que separa a escola da sua casa, ao Manuel, parece-lhe um caminho sem fim. Acaba de sair de casa quando se lembra que se esqueceu de fazer os trabalhos de casa. A noite vestiu as terras e as árvores com um manto branco de geada, que faz lembrar uma camada de neve, mas nem isso o faz sentir frio, pelo contrário, sente um calor esquisito percorrer-lhe o corpo que quase o faz transpirar. Falando com os seus botões, interroga-se o que deve fazer. "Será que devo ir à escola? "Pensa meter-se dentro de um palheiro que está ali próximo e ficar lá o resto do dia, mas para sua sorte ou para seu azar, está fechado à chave. Voltar para casa, é uma hipótese que está fora de questão, porque os pais não vão gostar de nenhuma justificação que ele apresente para faltar à escola. “Pode ser que o senhor professor se esqueça de perguntar pelos trabalhos de casa…” Sente-se melhor com este pensamento e dirige-se para a escola.
Grande azar tem o Manuel. As primeiras palavras que o professor Alfredo dirige à turma, são as seguintes: “Meninos é favor entregarem os trabalhos de casa.” Ah quanto o Manuel gostaria de ter a capacidade de se tornar invisível, ou de se poder evaporar neste momento. Todos os meninos se levantam para entregar os trabalhos ao professor. Todos, excepto o Manuel que, cabisbaixo, pálido e quase a chorar, permanece sentado na sua carteira. “Manuel, onde estão os teus trabalhos de casa?” Pergunta o professor. “Esqueci-me.” Responde o miúdo. “Então chega aqui.” Ordena o professor. O Manuel sabe o que o espera. A régua de madeira com cerca de dois centímetros de espessura e já escura nas pontas de tantas vezes ter batido nos alunos, vai cair nas suas mãos duas ou três vezes com toda a força que o professor Alfredo lhe pode imprimir e ele vai ficar com as elas inchadas e dormentes como já noutras ocasiões aconteceu. Vai sentir como que o mundo inteiro a cair-lhe em cima. Por isso, quando a régua na sua trajectória, se aproxima da sua mão, instintivamente a retira, fazendo com que o professor Alfredo cambaleie e quase caia para a frente.
Mas o que é que o Manuel fez?... Nunca ninguém viu o professor Alfredo desta maneira. Os seus olhos parecem faiscar de raiva e dos cantos da sua boca, brotam pequenas bolhas de espuma que fazem lembrar um touro ferido em plena arena. O Manuel foge para onde pode, para o fundo da sala. O professor Alfredo, primeiro atira-lhe com a esponja de apagar o quadro, depois corre atrás dele ao mesmo tempo que tira o cinto das calças. Tem que saltar por cima das carteiras para o conseguir agarrar.
Nas mãos do professor Alfredo, o Manuel é um verdadeiro saco de boxe. O cinto uiva no ar e acaba num “chlap” estrondoso no corpo do Manuel. Ouve-se o som das bofetadas na sua cara e o seu choro reprimido: “Não me bata mais senhor professor.”
O professor Alfredo só se dá por satisfeito quando se apercebe que da boca do Manuel sai sangue. Acaba de lhe partir dois ou três dentes.
Finda esta cena bárbara, o professor Alfredo ordena a três ou quatro miúdos que acompanhem o Manuel à fonte lavar a boca e a cara.
Regressados à escola, a aula recomeça como se nada tivesse acontecido.