07/05/12

Qual é o problema?


Era de raça preta o jovem que entrou para o autocarro numa das paragens entre a Cova da Piedade e o Laranjeiro. Equipado com um fato de treino do Sporting, calçado com uns ténis de marca, e de saco com o emblema do Sporting a tiracolo, parecia que vinha ele de um treino deste clube. O condutor do autocarro era também de raça preta, mas de um preto ainda mais carregado do que o jovem. Ao subir para o autocarro, o jovem sentiu o olhar do condutor cravado em si, mas não se descompôs; seguiu o seu caminho com a maior descontração do mundo e foi sentar-se numa das cadeiras por detrás da cabine do condutor. Este deixou passar alguns segundos e, olhando pelo retrovisor, perguntou: “Então, jovem?” O jovem que estava de costas, virou-se ligeiramente de lado e retrucou com o ar mais inocente alguma vez visto “Então o quê?” “Não há passe, não há bilhete, como é?" Indagou o condutor. Com toda a calma, o jovem levantou-se do seu lugar e aproximou-se do condutor e disse (…) “Então, porque não disseste logo?” Continuou o condutor. E o jovem desculpou-se (…) “Rua.” Ordenou o condutor. (…) Pediu o jovem. “Rua, já disse.” Insistiu o condutor “Porra para esta merda…” grunhiu o jovem escarrando para o chão da calçada enquanto descia do autocarro.

05/05/12

De regresso a casa


Estive a trabalhar durante a noite. Foram 12 horas (das 21 às 09) sem pregar olho. Ainda zonzo e cambaleante, saí à pressa e nem me lembrei que iria ser difícil aguentar, sem urinar, as cerca de 2 horas que em geral levo a chegar a casa, porque, muito embora não seja grande a distância, o trajeto é labiríntico: começo por apanhar boleia do meu local de trabalho até ao autocarro que me vai levar ao barco a Cacilhas. Aí apanho o cacilheiro para atravessar o rio. Uma vez no Cais do Sodré, se tiver tempo suficiente, palmilho a pé os aproximados 2 km que distam a Sta. Apolónia, se não, apanho o metro. De Sta. Apolónia a Alverca o comboio demora 15 a 20 minutos, depois é só andar mais 7 minutinhos a pé, e voilá, estou em casa.

Ora, estava eu a chegar a Cacilhas quando a minha bexiga me informou que precisava de ser despejada. Ao entrar no barco “O Lisbonense”, como é um barco de construção recente e de maiores dimensões que os anteriores, em vez de estar a perder tempo, dirigi-me a um dos tripulantes e perguntei: “Desculpe, pode informar-me onde são as casas de banho?” ”São no piso superior na parte mais a ré do barco.” Respondeu-me. Subi. Lá estavam. Só que estavam fechadas. Na porta, podia ler-se numa pequena placa metálica, a seguinte inscrição: “Durante a viagem, solicite a chave ao marinheiro de serviço.” Ainda experimentei a que se destinava aos deficientes, mas também essa estava fechada. “Estarão fechadas porquê?” Interroguei-me. Desci as escadas e, ao ver-me, o funcionário que me tinha dado a informação, abeirou-se de mim. Sabia que eu não tinha tido tempo para fazer necessidades. “Então?” Sibilou. “Está fechada.” Retorqui. “Mas a das senhoras está aberta!...” Observou ele num tom de uma frase inacabada e a pedir um LOL. Entusiasmado com a lição, segui-o escada acima. “Afinal a das senhoras também está fechada, se não, podia servir-se dela, uma vez que dá para trancar por dentro, mas uma vez que estou aqui, abro-lhe a dos homens.” Considerou. “Muito obrigado.” Respondi. Quando entrei fiquei desconsolado. Tinha imaginado uma casa de banho limpa e que, pelo menos, tivesse um rolo de papel higiénico, e talvez isso justificasse, um pouco, o porquê de estar fechada, mas nem uma coisa nem outra.

Como um azar nunca vem só, depois de mijar, surgiu-me a vontade de cagar. ”E agora?” Perguntei-me. Apalpei os bolsos e só encontrei um lenço de assoar o nariz. Em esforço e de cócoras, evitando o contacto com as bordas conspurcadas da sanita, lá fiz sair o cagalhão causador do meu reboliço intestinal. Com o guardanapo, limpei o rabo o melhor que pude. Carreguei no botão do autoclismo que, supostamente, deveria fazer jorrar um jato de água para arrastar consigo os detritos depositados e, em vez disso, ouvi um estalido seco parecido com o de uma pressão de ar acabada de desferir um chumbo. Abri a torneira que estava num dos cantos da casa de banho, passei as mãos num pequeno fio de água que, casualmente, escorria e saí secando-as nas calças.