12/10/10

A gare


O comboio estava a chegar à estação de Alverca, mas devido a uns problemas quaisquer, teve que parar cerca de 50 metros atrás do acostumado local. As pessoas que vinham na primeira carruagem, no hall próximo da cabine do maquinista, apressaram-se a premir o botão da porta com intenção de a abrirem, só que as portas ainda estavam trancadas porque o comboio ainda tinha que avançar mais uns metros. Não tardou que duas garotas de arganel no nariz, phones nos ouvidos e a ruminarem pastilhas elásticas, batessem com as mãos na porta que dava acesso à cabine do maquinista dizendo: “Então, mas esta merda abre ou não abre?” O maquinista, apercebeu-se da confusão e fez soar o seguinte aviso nos altifalantes: “Informam-se todos os passageiros de que o comboio ainda não chegou à gare, logo que chegue, as portas serão desbloqueadas.” Perante este aviso, as ditas cachopas ainda se indignaram mais e ladraram o seguinte, continuando a bater na porta: “Olha, agora quer-nos levar para o Oriente… Nós não queremos ir para o Oriente, abra mas é esta porcaria.”



Entretanto o comboio andou mais uns metros e as portas foram desbloqueadas. Uma das primeiras pessoas a sair dirigiu-se imediatamente para junto do maquinista e disparou: “Olhe lá, ó vizinho, para onde é que você quer levar esta coisa?” O maquinista ficou a olhar para ela embasbacado, se calhar a pensar o mesmo que eu: “De onde é que esta gente saiu? Só pode ter sido de um manicómio qualquer.”

11/10/10

A farsa

Recordo-me perfeitamente do rebentamento da “bomba”, quando há uns anos atrás a comunicação social denunciava os abusos sexuais de crianças da Casa Pia, acusando figuras públicas de estarem por detrás destes crimes hediondos. Carlos Cruz fora preso preventivamente por, na óptica do juiz, haver fortes indícios da prática de crime.


Lembro-me que, não obstante estes fortes indícios, se reuniram num almoço organizado por Fialho Gouveia, para demonstrarem solidariedade com o senhor, centenas de figuras públicas, das quais se destacavam: o maestro António Vitorino de Almeida, os cantores Rui Veloso, Paulo Gonzo e Paco Bandeira, os actores Raul Solnado e Marina Mota, a economista Helena Sacadura Cabral, os jornalistas Fernando Dacosta e Adelino Gomes, o criminologista Francisco Moita Flores e o ex-presidente da RTP e da Portugal Global João Carlos Silva.

Confesso que na altura fiquei perplexo com esta iniciativa, porque todos aqueles senhores não sabiam de forma alguma se estavam a apoiar um inocente ou um criminoso. Vamos pela pior das hipóteses: e se for um criminoso, não estará a ser precipitado este apoio? Toda esta farsa cheira-me a pressão sobre a justiça. Isto pensei eu. O tempo o dirá, continuei a pensar.

Agora que o dito senhor foi condenado, gostava de saber o que vai na cabeça dos solidários de quem pratica crimes destes… ou não acreditamos na justiça? Será que ela só é justa quando pune os miseráveis?