O populismo aumenta na proporção da
descredibilização do sistema democrático e das suas instituições. Quem é que dá
crédito a agentes políticos que em 46 anos nada fizeram para combater a praga que,
não obstante o esforço afadigado de um povo, faz com que os pobres estejam cada
vez mais pobres e os ricos cada vez mais ricos, sendo a fatia dos pobres
incomparavelmente maior do que a dos ricos? Falamos, é claro, da corrupção. Os
populistas chegam ao poder porque as pessoas (o cidadão comum, aquele para quem
a política se resume a um exercício de governantes e governados, onde os
primeiros deveriam zelar pelo bem-estar dos segundos) cansam-se e perdem a fé
um dia acalentada na vã esperança de que, mais dia menos dia, a honestidade
será o que mais caracterizará quem os governa. O populismo é filho desse
cansaço.
Nem era preciso aparecer nenhum ventura
para percebermos o cansaço e o descrédito de um povo. Basta pensarmos que desde
a primeira vez em que participámos em eleições livres a esta data, o número de
pessoas que se desinteressou pelo voto octuplicou, o que, traduzido por miúdos,
significa que a mensagem que a grande maioria do povo português quer fazer
chegar aos seus políticos é, em linguagem simples e direta, a seguinte: ide
todos bardamerda amais as vossas políticas.
Um dia destes assistimos a mais um caso
daqueles de entreter, daqueles em que os protagonistas acham que a maioria não
entende. E se calhar têm razão. O nosso primeiro ministro achou por bem não
propor a recondução do presidente do tribunal de contas para um novo mandato.
Choveu um chorrilho de comentários dos vários quadrantes insinuando que a não
recondução estava relacionada com críticas apontadas por esse senhor num
relatório, pondo em causa a transparência da utilização dos dinheiros que vão
chegar da união europeia com vista à retoma pós-pandemia.
Segundo esse relatório, a proposta de lei
do governo que pretende agilizar a contratação pública poderá “contribuir para
o crescimento de práticas ilícitas de conluio, cartelização e até mesmo de corrupção
na contratação pública”. Segundo o primeiro-ministro, o critério de não renovação
de mandato para cargos de natureza judiciária, foi fixado pelo governo com o
acordo do presidente da república, aplicando-se tanto a este cargo como à
procuradora-geral da república. Só falta ouvir o senhor presidente do tribunal
de contas. Veremos se ele irá à assembleia da república dar alguma explicação. Para
mim, e se calhar para muitos portugueses, deveríamos acreditar nos juízes
(desembargadores, conselheiros, presidentes dos tribunais, etc.). Digo deveríamos.
Mas como? Que dizer de rui rangel, e luis vaz das neves (e de outros que não chega
ao nosso conhecimento)? Eu poderei questionar: Será que, sabendo que não ia ser
reconduzido no cargo, o senhor juiz presidente do tribunal de contas quis dar
um ar da sua graça e apontar o dedo a situações que não apontaria caso fosse
reconduzido?
E que dizermos dos casos sócrates,
salgado, bancos, etc., etc.? É um cansaço mortal. É lógico que as pessoas
deixam de acreditar. Para os populistas não é preciso mais nada, basta-lhes uma
gorda fatia de abstencionistas. Depois é só servirem uma dose de retórica
demagoga enfeitada com uns pozinhos de umas balelas quaisquer a um povo cansado
de receitas que só servem para o espremer até ao canganho.
Não, eles não chegam ao poder pela força,
chegam através do voto. E tanto faz que a abstenção chegue aos cinquenta como
ao noventa por cento porque a lei eleitoral é cega nesse capítulo. Pior, se
setenta ou oitenta por cento das pessoas não votarem e se dos vinte ou trinta
por cento que votarem, a maioria votar populismo, o populista votado tem a faca
e o queijo não mão para poder alterar a constituição a seu bel-prazer, como
aconteceu, por exemplo, há uns anos na hungria.
Se tivermos em conta que os populistas
têm neste momento uma arma prodigiosa para chegar à grande faixa de pessoas
cansadas e persuadíveis, (veja-se o caso das eleições de trump e bolsonaro)
poderemos dizer, sem nos enganarmos, que estamos perante uma situação deveras
perigosa e que dentro em breve o planeta não será mais do que uma bola de
conflitos imprevisíveis.
João Amaral
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